Rev. William T. Scott
Tradução do original ‘Chesterton as a Religious write’
disponível no livro Chesterton and other essays
Tradução de Raul Martins
A TEOLOGIA sempre foi enxergada como um estudo sério. Ela lida de tal modo com os fundamentos da vida, caráter, e destino, que o tratamento que dispensa às grandes questões envolvidas deve, por necessidade, ser maximamente sóbrio. Foram envoltos por este espírito que os antigos teólogos prepararam suas obras monumentais. É, portanto, um tanto difícil presumir que aqueles ensinados a admirar os padrões convencionais da teologia hão de fazer qualquer coisa menor do que algumas caretas quanto ao advento do Sr. Chesterton como um escritor religioso. Chesterton carrega consigo demasiada cordialidade, sua risada é alta demais, e suas sentenças muito acrobáticas; para agradar o sóbrio admirador do antigo e honrado método de se declarar temas religiosos. E então, de quebra, possui mais uma qualidade que é opressiva ao pensador sistemático, sua presunção. Não que o teólogo não seja presunçoso. Todos os antigos eram justamente isto, mas sua absoluta convicção baseava-se no resultado de processos rigorosamente lógicos. Suas objeções ao Sr. Chesterton é que ele berra suas convicções de cima dos telhados das casas, acena em adieu aos aturdidos espectadores, e então desaparece pela viela seguido por um eco de gargalhadas lançadas ao vento. Tal maneira de apresentar a teologia não é considerada refinada. Deve-se liderar alguém através dos caminhos subterrâneos até que este se familiarize com as escuras passagens e saiba onde pisar; mas esta série de mergulhos e vôos acrobáticos de pensamentos sagrados, como um falcão que se atira à sua presa, é displicente e informal demais para obter bons louvores do sacrário teológico.
Outra objeção que poderia ser lançada ao Sr. Chesterton é a de que ele é muito jovem e ao mesmo tempo muito velho. Ele é como um Davi saindo a enfrentar Golias, e é discutível se carrega consigo qualquer seixo para sua funda. O homem possui violenta confiança, mas e seus músculos? Ele é extremamente conservador. O crítico elevado, que imagina ter irrefutavelmente estabelecido certas coisas, e julga ser uma tolice passar novamente pelo campo já queimado até as cinzas pelo fogo da alta crítica, sente que o Sr. Chesterton possui uma cabeça grisalha demais para que possa ser uma companhia benéfica aos joviais e atualizados estudiosos atuais. Mas parece inútil tentar que o Sr. Chesterton abandone quer seu método de expressão, quer suas bases conservadoras. Sr. McCabe, livre-pensador Inglês, fez um apelo urgente para que o Sr. Chesterton apresente mais decoro em sua apresentação das verdades religiosas.
“Ele (Chesterton) admite que estamos a travar uma guerra ingrata pelo que cremos ser a verdade e o progresso. Ele está fazendo o mesmo. Mas por quê, em nome de tudo que é razoável, deveríamos nós, ao concordar quanto à gravidade do assunto, imediatamente abandonar métodos sérios de conduzirmos a controvérsia? Por quê, quando a necessidade vital de nosso tempo é induzir os homens e mulheres a coletarem seus pensamentos ocasionalmente, e serem efetivamente homens e mulheres—não, a lembrarem que são de fato deuses que mantém o destino da humanidade sob seus joelhos—por que deveríamos pensar que este caleidoscópio de frases é inoportuno? Os balés de Alhambra, os fogos de artifício do Crystal Palace, e os artigos do Daily News do Sr. Chesterton possuem seu lugar em nossas vidas. Mas como um estudante social sério pode ser capaz de curar a irreflexão de nossa geração através de paradoxos retesados; como ele há de fornecer às pessoas uma apreensão sensata dos problemas sociais mediante artifícios literários; de resolver questões importantes por uma incansável enxurrada de metáforas e inexatos “fatos,” e substituir a imaginação pelo julgamento, eu não sou capaz de enxergar.”
Em resposta à esta crítica Sr. Chesterton escreveu:
“Sr. McCabe imagina que não sou sério mas apenas engraçado, pois imagina que ser engraçado é o oposto de ser sério. Ser engraçado é o oposto de não ser engraçado e nada mais. Se um homem expressa-se através de grotesca ou risível fraseologia, ou, antes, em uma imponente ou contida fraseologia, isto não é uma questão de motivos ou estado moral, é uma questão de linguagem instintiva e auto-expressão. A escolha de um homem em contar a verdade em longas sentenças ou curtas piadas é um problema análogo a se este homem escolhe contá-la em Francês ou Alemão… As duas qualidades, de gracejo e seriedade, não têm nada a ver uma com a outra, e não são mais comparáveis do que preto e triangular. Sr. Bernard Shaw é engraçado e sincero; o Sr. George Robey é engraçado e não sincero; Sr. McCabe é sincero e não engraçado; O Ministro comum não é nem sincero nem engraçado… Por qual motivo o Sr. McCabe deveria ser tão eloquente quanto ao perigo resultante de escritores fantásticos e paradoxais? Por que deveria ele ser tão ardente em desejar escritores sérios e verbosos? Não existem tantos escritores fantásticos e paradoxais. Mas há uma quantidade enorme de escritores sérios e verbosos; e é pelos esforços destes mesmos sérios e verbosos escritores que tudo aquilo que o Sr. McCabe detesta (e tudo que eu também detesto, para constar) mantém-se em existência e energia. Como pode vir a ser que um homem tão inteligente quanto o Sr. McCabe possa imaginar que paradoxos e gracejos barram o caminho? É a solenidade que está a barrar o caminho em cada departamento de esforços modernos. São seus próprios e favoritos ‘métodos sérios,’ sua favorita ‘gravidade,’ seu próprio favorito ‘julgamento’ que barra o caminho em todos os cantos.”
Obviamente, esta réplica não responde inteiramente à questão da sinceridade do Sr. Chesterton. Ela simplesmente dispensa a questão da possibilidade de ser sincero e engraçado ao mesmo tempo. Talvez o Sr. McCabe seja capaz de encontrar vários exemplos onde o Sr. Chesterton não pareça ser nem sincero nem engraçado, desta maneira lançando-o na mais baixa classe de suas próprias generalizações. Sr. Chesterton possui tal comichão por debates que se todos os bons já tiverem sido escolhidos para um lado, é provável que ele corra a ajudar o camarada em desvantagem. Ele o faz, não porque deseja lidar com sofismas, mas sim porque deseja extrair os poucos grãos de verdade que podem ser encontrados até mesmo no lado fraco, e jogá-los ao vento para que circulem. Ele parece ser um inspetor geral das coisas. Acredita que nada deve passar por ele sem que antes seja submetido a rigoroso teste. Todas as frases consagradas pelo tempo, todas as respeitáveis máximas, devem prestar contas perante a inquisição com revigoradas credenciais. Nada há de passar simplesmente por ser antigo—deve também ser verdadeiro. Sr. Chesterton é o maior desafiador do dia, e esta é a razão pela qual para muitos ele mostrou-se tão inspirador. Mas o homem que está sempre a vigiar vive precariamente; e especialmente quando, como no caso do Sr. Chesterton, está sempre a fazer barulho. Alguns poucos e bem-mirados projéteis de emboscada provavelmente hão de encontrar um reluzente alvo. Sr. Chesterton é um sentinela loquaz; talvez, poderíamos dizer, um sentinela vociferador. Ele faz tamanha algazarra em seu plantão que acaba por alcançar dois fins que não estão de maneira alguma inclusos nos deveres de seu ofício; a saber, aquele de chamar a atenção do inimigo dos postos avançados do campo, e aquele de manter seus próprios soldados acordados através de seu extraordinário barulho. Enquanto sentinela não pratica quaisquer atividades silenciosas. O homem parece cortejar todo tipo de desastres, regojizando-se no fato de poder vir a se transformar em um alvo para os dardos do inimigo. Mas, mesmo com estas excentricidades, permanece uma imprudência afirmar que o Sr. Chesterton não é sincero. Dificilmente há de se presumir que qualquer homem tão espontâneo e fecundo em suas produções quanto o Sr. Chesterton irá tomar o tempo necessário para repassar todas as suas obras e checar uma por uma suas declarações para que concordem. Ele não é um criador de sistemas, apenas um tipo de escavador e crítico em geral. Seus grandes movimentos podem ser descuidados e explicam porque o padrão acaba por sair desnivelado. Neste ponto podemos contrastá-lo com Bernard Shaw. Sr. Shaw é um cético, e como o Sr. Chesterton mostrou, um cético cobre o terreno lentamente, posto que precisa testar cada passo antes de avançar. É por esta razão que quase todas as obras do Sr. Shaw são prefácios. Ele jamais tem tempo de fazer qualquer coisa a mais do que começar. É preciso fé para se fazer coisas na literatura bem como na religião. A fé de Chesterton confere-lhe celeridade. Mas estar perpetuamente em vôo rápido e rasante, e, ao mesmo tempo, manter uma percepção acurada do solo acima do qual se voa, é tarefa difícil. Não acreditamos que o Sr. Chesterton seja insincero por algumas penas de sua imaginação caírem ocasionalmente em nossos pés de maneira desordenada e vã. Não temos conhecimento de qualquer argumento extenso que empreendido por ele que não mostre perspicácia lógica e a mais completa honestidade.
Mas a grandeza de um homem há de ser encontrada na quantidade de obras construtivas por ele realizadas, e não em sua exatidão de detalhes sobre questões sem importância. Acreditamos que o Sr. Chesterton tem realizado algumas das obras mais valiosas pela causa da religião e teologia do que qualquer outro homem o fez em nossos dias. Sua obra é o advento de um homem literário e poeta em um campo que no passado praticamente obliterou esta raça, e o resultado foi um tanto feliz. Mas não devemos esperar que o Sr. Chesterton mostre o mínimo de convencionalidade no trato destes temas, bem como não o mostra ao tratar tópicos individuais.
Enquanto protagonista da religião conservadora, Sr. Chesterton primeiramente inicia com um apelo para que os homens tenham algumas convicções definidas. Ele contende que a raça não há de chegar a lugar algum a menos que acredite em algo com tremenda seriedade. Mostra-nos que a fraqueza de nosso tempo nasce daquele falso liberalismo que é tão predominante. Esta fuga do tempo onde a punição era dispensada aos heréticos foi carregada longe demais, e o resultado é que nós, enquanto raça, estamos a tentar progredir sem o semblante da doutrina. Mantemos nossas visões tão modesta e levianamente que as trocaremos com o primeiro recém-chegado assim como garotos trocam entre si canivetes “ocultos e invisíveis.” Julgamos graciosa a flexibilidade, e concordar é sempre o lote de um cavalheiro. Temos certeza que nenhum herético será queimado nas estacas, e esta é a mais alardeada vanglória de nossa civilização. Não é este um sinal de que avançamos? Não aprendemos mais sobre o espírito da fraternidade? e não temos nos colocado a caminho do milênio com uma boa corrida de início que rapidamente há de trazer-nos o objetivo dos dias felizes? Mas aqui Sr. Chesterton lança-nos um sinistro olhar, e as palavras que saem de sua boca são surpreendentes:
“É tolice, falando de modo geral, que um filósofo ateie fogo em outro filósofo no Mercado de Smithfield por este não concordar com sua teoria sobre o universo. Isto foi feito com muita frequência na última decadência da Idade Média, e falhou completamente em seu objetivo. Mas há algo que é infinitamente mais absurdo e pouco prático do que queimar um homem por sua filosofia. Isto é o hábito de dizer que sua filosofia não importa, coisa que é feita universalmente no Século Vinte, na decadência do grande período revolucionário. Teorias gerais são em todos os cantos condenadas; a doutrina dos Direitos do Homem dispensada juntamente com a Queda do Homem. O próprio Ateísmo é muito teológico para nós atualmente. A própria Revolução é muito sistêmica; a liberdade muito limitada. Não teremos generalizações. Sr. Bernard Shaw resumiu a visão em um perfeito epigrama, ‘A regra de ouro é que não há regra de ouro.’ Inclinamo-nos mais e mais por discutir detalhes na arte, política, literatura. A opinião de um homem sobre bondes importa; sua opinião sobre Botticelli importa; sua opinião sobre todas as coisas não importa. Ele pode sair e explorar um milhão de objetos, mas ele não deve encontrar um estranho objeto, o universo; pois se o fizer, há de ter uma religião, e então estará perdido. Todas as coisas importam—exceto todas as coisas.”
Sr. Chesterton mantém que a coisa mais importante sobre um homem é sua teoria sobre o universo. Isto é na prática a única coisa que de fato importa. Sua voz torna-se aguda e penetrante ao expressar o desprezo para com aqueles que, por serem modestos demais para ter uma opinião, imaginam que com isto estão a ensinar uma lição de mui necessária humildade. Há algo militante nestas elocuções. Elas cortam como uma faca a medula de nossa indiferença mental para com as grandes coisas do universo. É inútil falarmos de progresso a menos que tenhamos alguma definição de progresso. Uma sociedade de formigas pode ser capaz de fazer algumas coisas notavelmente bem, mas ninguém afirma que a sociedade em questão tenha avançado um passo sequer desde os dias de Salomão. Definir o progresso a partir de um ponto de vista utilitário pode exibir uma justificação para nossa era inventiva. Mas um progresso que simplesmente olha para a conveniência de um homem e não possui qualquer contribuição a fazer para o desenvolvimento das mais excelentes faculdades e simpatias deste homem, não é um progresso que valha a pena ser mencionado. Sr. Chesterton tem mostrado que o problema de nossos dias é a falta de definições. A doutrina é algo absolutamente necessário para a saúde da alma. Devemos definir o objetivo antes de alcançarmos qualquer objetivo que valha o esforço. Discutimos a relação entre doutrina e vida, e colocamos tal ênfase sobre a vida ao ponto de nos esquecermos que qualquer tipo respeitável de vida só pode ser alcançada por homens que acreditam em alguma sã doutrina.
Mas aqui, a questão surge, “Qual é o tipo de doutrina na qual um homem deve acreditar?” Este é, obviamente, o campo de batalha para os teólogos. Aqui, Sr. Chesteston simplesmente adota o método pragmático. No que devemos acreditar para nosso bem maior? Esta foi a questão que o Sr. Chesterton fez a si mesmo antes que aceitasse o Cristianismo, e quando satisfez-se quanto às coisas que devem ser encontradas no mais elevado caráter, maravilhou-se de encontrá-las todas em sua busca pelo Cristianismo conservador. Em uma interessante passagem ele nos conta como os livre-pensadores ajudaram-no em sua crença:
“Jamais li uma linha sequer de apologética Cristã. Leio o mínimo que posso atualmente. Foram Huxley, Herbert Spencer e Bradlaugh que trouxeram-me de volta à teologia ortodoxa. Eles semearam em minha mente as primeiras loucas sementes de dúvida quanto à dúvida. Nossos avós estavam um tanto corretos quando disseram que Tom Paine e os livre-pensadores perturbavam a mente. Eles o fazem. Perturbaram a minha terrivelmente. O racionalista fez-me questionar se havia qualquer utilidade em absoluto na razão; e quando terminei Herbert Spencer cheguei a duvidar (pela primeira vez) se a evolução havia de fato ocorrido. Ao terminar a última página da última das palestras ateístas de Ingersoll, o medonho pensamento traspassou minha mente, ‘Tu quase convenceu-me a me tornar um Cristão.’ Eu estava desesperado.”
É provavelmente um motivo de felicitação para o Cristianismo conservador que o Sr. Chesterton não tenha, em sua juventude, familiarizado-se com a Apologética Cristã. Sua disposição naturalmente belicosa teria encontrado amplo espaço para esporte nos imensos tomos com seus sistemas imaculados, e há uma grande probabilidade de que o homem que veio a se tornar um dos mais hábeis apologistas do dia, houvesse se perdido antes mesmo de tocar os aspectos vitais do Cristianismo. Mas sua mente começou a orientar-se através da oposição, e ele descobriu que as coisas mais amargamente atacadas eram justamente aquelas mais necessárias à vida. Enxergou que a vida dissolvia-se sem o Cristianismo—que esta era a única filosofia ou religião no mundo capaz de responder a todas as necessidades do homem. Foi aí, através da contemplação de suas necessidades, que ele logo encontrou sua teologia crescendo. Aceitou o pragmatismo como um método mas não como uma filosofia. Declarou que este era um bom método para se começar, mas que existiam extremos no pragmatismo que eram destrutivos. Por exemplo, o pragmatismo declara que o homem deve acreditar naquilo que lhe faz bem, mas que ele não precisa entrar no campo da metafísica e acreditar no Absoluto. Mas o Sr. Chesterton afirmou que a crença no Absoluto era tão necessária quanto a crença em qualquer coisa que tocasse suas necessidades diárias. A crença no Absoluto era uma necessidade diária. Desta maneira, podemos enxergar a teologia do Sr. Chesterton como algo que emana da experiência. Mas ele chega muito mais longe ao começar a coletar os itens de sua crença. Ele faz um apelo à história. Que coisas prevaleceram através dos séculos? tais coisas são dignas de consideração. Em surpreendente e eloquente passagem presente em “Os Paradoxos do Cristianismo,” ele fala sobre o progresso da ortodoxia.
“As pessoas adquiriram o tolo costume de falar da ortodoxia como algo pesado, enfadonho e seguro. Jamais houve algo tão perigoso ou excitante quanto a ortodoxia. Ela era sanidade: e ser são é mais dramático que ser louco. Era o equilíbrio de um homem conduzindo cavalos em louca disparada, parecendo ora vergar para um lado, ora para outro, mas em cada atitude mantendo a graça de uma escultura e a precisão da aritmética. A Igreja em seus primeiros dias correu violenta e velozmente com qualquer cavalo de batalha; no entanto, é totalmente anti-histórico dizer que ela apenas cometeu loucuras apegando-se a uma única ideia, como um fanatismo vulgar. Ela curvou-se para a esquerda e para a direita, na medida exata a fim de evitar enormes obstáculos. Num dado momento abandonou o enorme vulto do arianismo, apoiado por todos os poderes deste mundo para fazer o cristianismo mundano demais. No instante seguinte estava se curvando para evitar o orientalismo, que o teria espiritualizado demais. A Igreja ortodoxa jamais tomou a rota fácil ou aceitou as convenções; a Igreja ortodoxa jamais foi respeitável. Teria sido demasiado fácil aceitar o poder mundano dos Arianos. Teria sido demasiado fácil, no século Dezessete, cair no abismo infindável da predestinação. É fácil ser louco; é fácil ser um herege. É sempre fácil deixar-se levar por sua época; a coisa difícil é manter sua própria cabeça. É sempre fácil ser um modernista, assim como é fácil ser um esnobe. Ter caído em qualquer uma destas armadilhas de erros e exageros, que moda após moda e seita após seita abriram através da história da Cristandade—isto teria de fato sido fácil. É sempre simples cair; existe uma infinidade de ângulos nos quais podemos cair, apenas um no qual podemos ficar de pé. Ter caído em qualquer uma das modas do Agnosticismo à Ciência Cristã teria sido de fato óbvio e maçante. Mas ter evitado-os a todos tem sido uma esfuziante aventura; e em minha visão a biga* celestial voa ribombante através das eras, com as enfadonhas heresias a espalhar-se e prostrar-se, e a verdade, cambaleando, mas ereta.”
Sr. Chesterton é essencialmente um poeta que perdeu-se no reino da teologia. Trouxe consigo suas fantasias e imaginações, bem como todo o apetite de sua natureza estética, à mesa do Cristianismo. Talvez não seja errado declarar que o Cristianismo tem satisfeito sua imaginação mais completamente que sua razão. Não que ele julgue-o incompleto enquanto sistema racional ou lógico, mas sim por estar inclinado a olhar com olhos estranhos qualquer sistema que pretenda oferecer completa logicidade. Mas o Cristianismo é muito mais do que um sistema lógico. Ele ajusta-se às mais elevadas imaginações do homem e vem para satisfazer suas necessidades. Que um homem sinta todos os saudáveis anseios da alma, pois há de encontrar um banquete esparramado à mesa pelo Cristianismo. Ele vem primariamente a fim de satisfazer a vida. Todos os sistemas que são resultado de puro pensamento acabam em completa nulidade. O materialismo é lógico, mas acaba em insanidade. O idealismo, quando completamente seguido, adapta o homem para um hospício. A lógica é uma linha reta entre dois pontos, mas a vida é linha que serpenteia. O Cristianismo curva-se para lá e para cá com a vida humana e se adequa a esta como uma luva. O Cristianismo é, portanto, paradoxal. Ele é verdadeiro, mas suas virtudes não são razoáveis. Os sistemas pagãos eram sistemas precisos de pensamento. Jamais desviavam de um objetivo pré-estabelecido. Dadas as premissas, o final viria com precisão certa. Não havia cambaleios, não havia qualquer pegar de rotas vadias para lugares onde o semi-caos reinava. O mundo pagão vivia imerso em filosofias completas, mas vivia apenas metade de uma vida. O Cristianismo veio com uma vida completa. O homem não poderia viver apenas com o pão da filosofia. Ele precisava de um alimento que jamais passara pela cabeça do filósofo. O filósofo não poderia apontar suas necessidades, muito menos apontar como satisfazê-las. Se alguém, portanto, perguntasse ao Sr. Chesterton, “Seu Cristianismo não é falso, se não for, como você diz, necessariamente razoável?” O Sr. Chesterton poderia responder de várias maneiras. Em primeiro lugar, ele poderia dizer que falso não é a antítese de razoável. Ou, novamente, poderia dizer que existem dois tipos de razão—a razão mais ampla que compreende a totalidade da vida, e com a qual o Cristianismo jamais discorda; e a razão que move-se para sempre em linha reta através do auxílio de um silogismo, e que é ela mesma um padrão demasiado deficiente para medir o Cristianismo. Tomemos a fé, esperança, caridade, e humildade, quatro das virtudes distintivas do Cristianismo, e cada uma contém em si um paradoxo. Fé significa uma crença no incrível, caso contrário não é virtude. Esperança significa confiar quando não há esperanças, senão não é virtude. Caridade significa perdoar o que não pode ser perdoado, senão não é virtude. A humildade Cristã significa a negação de si mesmo, mas também significa o encontrar de si mesmo. A razão pela qual estas grandes virtudes não foram descobertas por nenhum dos filósofos pagãos encontra-se no fato de que estes jamais desviaram-se da linha da pura razão. Eles podiam falar sobre temperança e justiça, pois as mesmas eram virtudes perfeitamente compreensíveis, e poderiam ser expandidas por processos razoáveis.
Quando, portanto, perguntamos ao Sr. Chesterton quais são suas respostas a estes assim chamados sistemas lógicos de filosofia, ele mantém-se perfeitamente consistente com sua própria filosofia do Cristianismo. Ele simplesmente mostra como estes debilitam a vida, e algumas das mais devastadoras coisas ditas em anos recentes contra as várias filosofias o foram ditas pelo Sr. Chesterton.
Ao falar de Nietzsche, ele declarou: “A aristocracia de Nietzsche possui toda a sacralidade própria aos fracos. Quando ele nos faz sentir que não pode mais suportar as inumeráveis faces, as vozes incessantes, a avassaladora onipresença que pertence ao povo, ele terá a simpatia de qualquer um que já tenha sentido enjoo em um navio a vapor, ou cansaço em um ônibus lotado. Todo homem odiou a humanidade ao ser ele mesmo menos do que um homem. Todo homem já enxergou a humanidade como um cegante nevoeiro, já sentiu a humanidade em suas narinas como um cheiro sufocante. Mas quando Nietzsche possui o incrível humor e falta de imaginação de pedir que acreditemos que sua aristocracia é uma aristocracia de poderosos músculos ou uma aristocracia de vigorosas vontades, faz-se necessário apontar a verdade. Ela é uma aristocracia de nervos fracos.”
Sobre Herbert Spencer ele disse: “Herbert Spencer teria ficado um tanto aborrecido se alguém lhe chamasse de imperialista, e é portanto altamente lamentável que ninguém o tenha feito. Mas o homem era um imperialista do tipo mais baixo. Ele popularizou esta desprezível noção de que o tamanho do sistema solar deveria intimidar o dogma espiritual do homem. Por qual razão deveria um homem renunciar à sua dignidade perante o sistema solar e não fazer o mesmo diante de uma baleia? Se o mero tamanho mostra que o homem não é a imagem de Deus, então talvez uma baleia seja a imagem de Deus; uma imagem um tanto amorfa, talvez um retrato impressionista. É simplesmente fútil argumentar que o homem é pequeno quando comparado ao cosmos, pois o homem sempre foi pequeno comparado à árvore mais próxima. Mas Herbert Spencer, em seu impetuoso imperialismo, insistiria que fomos de certa maneira conquistados e anexados pelo universo astronômico.”
As coisas que disse sobre Marco Aurélio, também não poderia ter dito sobre Emerson? “Ele era um egoísta altruísta. Um egoísta altruísta é um homem que possui orgulho sem a desculpa da paixão. De todas as piores formas possíveis de iluminação, a pior delas é aquela que as pessoas chamam de Luz Interior. De todas as horríveis religiões a mais horrível é a adoração do deus interior. Qualquer um que saiba qualquer coisa saberá como ela funcionaria; qualquer um que conheça qualquer integrante do Higher Thought Centre sabe de fato como ela funciona. O fato de João adorar o deus dentro de si significa apenas que João adora João. Que João adore o sol ou a lua—qualquer coisa, menos a Luz Interior; que João adore gatos ou crocodilos, se puder encontrar um em sua rua, mas não o deus interior. O Cristianismo veio ao mundo primeiramente a fim de afirmar com violência que o homem não deveria apenas olhar para dentro de si, mas também para fora de si, que ele deveria contemplar com entusiasmo e assombro uma companhia divina e um capitão divino. A única diversão de ser um Cristão era que um homem não era deixado sozinho com a Luz Interior, mas reconhecia de maneira definida uma Luz exterior, límpida como o sol, clara como a lua, tão terrível quanto um exército com estandartes.”
Quando Sr. Chesterton lida com o materialismo, o idealismo, o estoicismo, e outros sistemas filosóficos, ele simplesmente mostra o efeito destes sobre a vida humana. Seu método, como já declaramos, é pragmático. Aquilo que rebaixa o tom da vida, é por ele considerado falso e deve definitivamente morrer. Uma das passagens mais interessantes e engraçadas nos escritos de Sr. Chesterton refere-se ao Sr. Blatchford e envolve a grande questão do livre arbítrio. O Sr. Blatchford era um determinista, mas esquecia-se de aplicar sempre sua filosofia às coisas práticas da vida; de fato, ele falhava em enxergar que sua filosofia não poderia ser aplicada às coisas da vida. Em um destes momentos de completa amnésia, ele declarou que se encontrasse um pequeno garoto batendo em sua irmã, não iria punir o garoto, mas sim fazer-lhe um apelo nestas palavras:
“Meu pequeno rapaz, você não deve bater em uma garota. Isto é covardia. Homens não batem em mulheres. E você não deve permitir ser levado por uma paixão. Se o fizer, seu temperamento há de lhe dominar. Vamos garoto, seja um cavalheiro. Quem irá amar sua irmã se você não o fizer? E se ela realmente lhe importunou? Deixe-a. Ela aprecia isto, abençoe-a. E você não é nenhum bebê. Ora! Não seja tolo. Coloque seu boné, e jogaremos um pouco de críquete.”
Ora, não há dúvidas de que este seria considerado um bom conselho por qualquer um que não tivesse uma filosofia da qual falar, mas Sr. Blatchford havia sido muito volúvel com sua filosofia, e sem demora Sr. Chesterton pega-o com as calças nas mãos:
“Você disse que falaria desta maneira com o pequeno garoto. Espero que me perdoe quando digo que julgo sábio de sua parte escolher um pequeno garoto: eu recomendo que seja um garoto realmente pequeno. Mas não fale desta maneira com qualquer um que tenha lido suas obras filosóficas. Se o pequeno garoto, ao invés de confinar-se à histórias de aventuras (que podem ser chamadas de literatura do Livre Arbítrio), devesse equipar-se de vários exemplares do The Clarion, com sua filosofia e sua fraseologia, ele iria, eu creio, abrir seus lábios infantes e fornecer uma devastadora resposta, mais menos como esta que segue:
“Que sentido devo atribuir, meu caro pai, à sua extraordinária declaração de que eu não devo bater em Zenobia? Que eu já o tenha feito prova que eu deveria tê-lo feito. Aquela pancada foi o resultado inevitável da hereditariedade e ambiente. Minha hereditariedade um tanto feroz (derivada possivelmente do Senhor), e o ambiente (caso contrário Zenobia) produziram um resultado como aqueles na química. Você diz que é covardia. Eu lhe asseguro, com tranquilidade científica, que eu nasci covarde. Quanto à sua afirmação de que ‘homens não batem em mulheres,’ meu mui limitado conhecimento da vida permite-me respondê-la diretamente com uma negativa. Os homens o fazem. Mantenho-me agnóstico quanto à questão de quem deverá amar minha irmã se eu não o fizer. Mas estou um tanto certo de que alguém ou ninguém deve fazê-lo se eu não puder. Salvo a expressão, ‘abençoe-a’—a qual, provavelmente uma abreviação de ‘Deus a abençoe,’ eu não posso senão julgar como um relíquia de barbárie—permaneço um tanto claro em permitir que você ame a jovem garota se puder. É um joguete de seu temperamento inerente amar Zenobia. É um joguete do meu bater nela. Está respondido?’ ”
Acreditamos que o Sr. Chesterton emitiu algumas das mais perspicazes declarações emitidas por qualquer homem de seus dias sobre a relação da espiritualidade com a evolução e sobre a absoluta insustentabilidade da posição agnóstica. Sua crítica sobre uma ciência que está sempre a procurar por seu deus através de um microscópio é severa, porém justa.
Mas devemos reconhecer que o Sr. Chesterton mostra sua habilidade ao recusar o confinamento ao método pragmático de determinar a validade da doutrina ortodoxa. O Pragmatismo é uma boa arma em suas mãos para usar contra alguns dos sistemas filosóficos do dia, mas quando ele passa a construir um sistema construtivo, encontra-se compelido a resolver alguns dos problemas que o pragmatismo não pode senão tocar de maneira extremamente limitada. Ao lidar com o miraculoso nas Escrituras ele simplesmente afirma sua crença como algo baseado em evidências históricas. Ele fez uma chocante afirmação que pode trazer consigo um longo comboio de sugestões. Ele diz: “Todo o altaneiro materialismo que tem dominado a mente moderna repousa ultimamente em uma suposição; uma falsa suposição. Supõe-se que se algo continua a repetir a si mesmo isto está provavelmente morto; um pedaço de engrenagem… Mas talvez Deus diga todas as manhãs, ‘Faça de novo’ ao sol, e todas as noites, ‘Faça de novo’ à lua. Pode não ser a necessidade automática que torna todas as margaridas iguais; pode ser que Deus as faça a cada uma separadamente, mas nunca se canse de fazê-las. Pode ser que Ele tenha o eterno apetite da infância; pois nós pecamos e envelhecemos, e nosso Pai é mais novo do que nós.”
Podemos facilmente supôr que uma visão como esta pode sujeitar o Sr. Chesterton a alguns problemas em explicar um linha de fenômenos não tão agradáveis de se contemplar quanto a criação da margarida; mas como ele mantém uma vívida fé também na existência de um diabo pessoal, teria uma convincente resposta na ponta dos lábios.
Ninguém pode falhar em notar a ênfase que Sr. Chesterton colocou sobre a característica da humildade. É uma ênfase que parece ser completamente desproporcional ao espírito com o qual normalmente escreve. Mas, não obstante, uma das maiores contribuições que ele fez ao Cristianismo é o apoio que tem oferecido à virtude da humildade. Por esta atitude, notamos o contraste entre ele e Emerson, e vemos como sua mensagem preenche os defeitos em Emerson. O antigo escritor fez talvez sua maior contribuição à literatura e vida ao insistir que o espírito deve estar livre em sua busca pela verdade. Ao tocar a questão da auto-confiança, Emerson trouxe emancipação a muitos que haviam permitido que os grilhões dos costumes e tradição lhes fosses impostos. Ele foi aclamado como o apóstolo do senso comum, o libertador da razão cativa, e forneceu a deixa para muito do que de mais inspirador tem sido produzido na literatura desde então. Mas para muitos de nós a inspiração de Emerson era similar à inspiração que multidões encontram no uso do vinho. Ela fez com que nossos sentidos formigassem; pintou raras figuras de progresso diantes de nossos olhos; pareceu colocar em nossas mãos uma Carta Magna de liberdade; trouxe consigo um senso de poder espiritual e intelectual, até o ponto de imaginarmos que o brilho de Merlin aparecera sobre as nuvens, e que éramos capazes não apenas de encontrá-lo mas também de segui-lo. Mas quando as bolhas douradas tremulando sobre a borda do copo perdiam seu poder efervescente, então a visão dissipava-se, e o dia mais uma vez retornava com sua neblina e calafrios. Não concluímos que a inspiração de Emerson era a inspiração da intoxicação. Não somos o mesmo homem que éramos antes de seu espírito nos tocar. Ganhamos, mas a lei da compensação que ele expôs fez-se manifesta, e receamos que algo nos tenha escapado enquanto pensávamos estar enriquecendo-nos com as pérolas de seu pensamento. Descobrir qual foi esta perda definida é definir o limite de sua contribuição, e através disso reduzir muito de nossa estima por sua grandeza.
Acreditamos que a fraqueza essencial de Emerson encontrava-se em sua falta de humildade. Esta era a única grande virtude da alma sobre a qual ele não se sentiria confiante em escrever. Amor, amizade, heroísmo, leis espirituais eram temas nos quais ele demorou-se com insuperável esplendor. Mas a humildade opunha-se à sua doutrina da auto-confiança e destruía toda sua teoria da grandeza. Ele mantinha que o homem não fora feito para curvar-se, mas para escalar, para subir. Ele deveria apenas abrir as portas e libertar seu espírito. Sua doutrina era a doutrina da auto-emancipação. O homem é a medida de todas as coisas. Que o homem siga apenas seus próprios instintos, e ele há de prosseguir rumo à deificação. Temos tropeçado nas coisas exteriores, mas o homem jamais deveria tropeçar. Tal é a doutrina de Emerson. Ela possui o fascínio de todas as doutrinas que lançam o homem de volta a si mesmo e borrifam água de rosas sobre seu caráter. Ela possui o fascínio de todos os sistemas que clamam por auto-admiração. Jamais superamos o período da vida no qual relutamos em receber elogios. Somos, por vezes, tímidos demais para considerar que todas as coisas expressam nossa grandeza, mas às palavras bem-intecionadas e judiciosas estamos sempre a escutar. E a doutrina de Emerson parece a mais inspiradora das doutrinas, pois faz com que pensemos coisas boas sobre nós mesmos. Ela coloca a mais elevada aprovação—a saber, a nossa—sobre nossos poderes e performances. Mas este auto-louvor não dura para sempre. Existe algo fora do homem que ele deve ouvir. Existem grandes performances ocorrendo no cosmos que devem chamar sua atenção. A marcha rítmica dos corpos celestes não se dá através de seus comandos. Ele não criou os mares. Ele não é capaz de guiar Arcturo com seus sóis, e mal explicou o balancear das nuvens; e o homem não pode manter para sempre esta pequena comédia de auto-elísio e auto-onisciência enquanto o estrondo de coisas maiores retumba ao seu redor.
Emerson elevou-se ao mais alto poder, e isto, obviamente, significa que Deus deve partir. Com a exoneração de Deus, não havia mais qualquer necessidade de manter as doutrinas do pecado e desastre; e Emerson guiou o homem a um pequeno céu construído por mãos humanas, com algumas pequenas estrelas e uma lua crescente brilhando alguns metros acima de sua cabeça, como alguma peça teatral sobre Pyramus e Thisbe de nossos dias de crianças. Mas devemos duvidar da sabedoria deste método de tornar um homem sábio e feliz. Sr. Chesterton apresenta-nos a grande doutrina da humildade. De maneira superficial esta não parece tão inspiradora quanto a doutrina Emersoniana da auto-exaltação, mas carrega consigo uma autoridade que deve prevalecer sobre aquela de Emerson, a saber, a autoridade de Jesus Cristo de Nazaré. Ela é expressa na frase, “Aquele que desejar ser o maior entre vós seja um servo,” e o funcionar desta lei expresso em, “O que a si mesmo se exaltar será humilhado; e o que a si mesmo se humilhar será exaltado.” A humildade é a única virtude que traz consigo o mundo como uma contribuição à alma. “Os mansos herdarão a terra.” Sr. Chesterton disse com grande verdade, “A humildade é aquilo que está para sempre a renovar a terra e as estrelas. É a humildade e não o dever que preserva as estrelas do erro, do erro imperdoável da resignação casual; é através da humildade que os mais antigos céus para nós permanecem viçosos e fortes.” Estas são sábias palavras, e o mundo carece de escutá-las. Se a terra deve recuperar para nós sua juventude perdida; se os caminhos devem levar-nos, como antigamente, às câmaras nas quais habitam a primavera, onde nossos amores são capturados pelas maravilhas da vida que rebenta, e pelos milagres que operam abaixo do solo; se nossas faces devem reluzir perpetuamente pelo tingir das folhas por algum sábio gênio a carregar doce mágica nas pontas de seus dedos—então devemos reaprender a lição da humildade. Busquemos, não Emerson, mas tracemos nosso caminho de volta com frontes curvadas até a presença d’Ele, que diz, “Num alto e santo lugar habito; como também com o contrito e abatido de espírito, para vivificar o espírito dos abatidos, e para vivificar o coração dos contritos.”
É para a honra do Sr. Chesterton que este não considerou o Cristianismo simplesmente como uma crença a ser escorada, mas como uma vida a levedar o mundo. Acreditamos que sua maior contribuição à causa da religião é o entusiamo com o qual ele contempla a possibilidade de uma conquista mundial. Naquele maravilhoso capítulo em “Ortodoxia,” “A Bandeira do Mundo,” encontram-se algumas das mais mordazes declarações já feitas ao espírito missionário. O Cristianismo está no mundo para a conquista. Ele não está aqui simplesmente a fim de fornecer um credo para o pensamento, ou um sistema especulativo para os Acadêmicos. Ele chega com um berro para chamar a atenção; ele chega com uma urgência que demanda serviço. Seu chamado não é apenas tenro, mas peremptório. “Vá até às ruas e obriga-os a entrar.” É um evangelho de força, a mais notável força em todo o mundo—a força do amor. Não é uma simpatia piegas, um desejo débil e esmaecido de que os homens possam encontrar Deus, mas sim um amor que subjuga com o zelo de um guerreiro—imponente, dinâmico, universal. Quando os homens compreenderem este poder, logo o mundo há de ornar-se com as vestimentas da retidão. Estas são palavras incendiárias:
“Para nossos propósitos titânicos de fé e revolução, o que precisamos não é de uma fria aceitação do mundo como um compromisso, mas sim de algo que nos capacite a sinceramente amá-lo e sinceramente odiá-lo. Não desejamos que a alegria e a raiva neutralizem uma à outra e produzam um contentamento ranzinza; desejamos um ardente prazer e um ardente descontentamento. Temos que considerar o universo ao mesmo tempo como o castelo de um Ogro a ser invadido, e como nosso próprio chalé, ao qual podemos voltar no final da tarde. Ninguém duvida de que o homem comum possa avançar neste mundo, mas exigimos, não a força suficiente para nele avançar, e sim a força suficiente para fazê-lo avançar. Será que o homem comum é capaz de odiar o universo suficientemente para mudá-lo, e ainda assim amá-lo suficientemente para julgar que a mudança vale a pena? Será que ele é capaz de admirar seu bem colossal sem sentir imediatamente submissão? Será que ele é capaz de olhar para sua colossal perversão sem jamais sentir desespero? Será que ele é capaz, em resumo, de não ser apenas um pessimista e um otimista, mas um fanático pessimista e um fanático otimista? É ele pagão o suficiente a ponto de morrer pelo mundo, e Cristão o suficiente a ponto de morrer para o mundo? Nesta combinação, eu mantenho, é o otimista racional quem falha, o otimista irracional quem obtém êxito. Ele está pronto a esmagar todo o universo em benefício do próprio universo.”
Acreditamos que o Sr. Chesterton tem avançado a causa do Cristianismo como um de seus mais valentes campeões. Munido de imenso senso comum, observou suas reinvidicações conferindo-lhes sua aquiescência. O Cristianismo foi evocado como um teste para a vida e não para credos, e nisto reside sua grande superioridade em relação ao apologista comum. Não que ele rejeitasse credos; ele é um dos mais robustos campeões pela necessidade da doutrina. Dono de um dogmatismo assertivo, ganhou sua doutrina ao enxergar como o Cristianismo lidava com a vida. Existem campos na teologia que ele não tocou nem se importaria em tocar—os campos técnicos, onde o alto crítico pode encontrar seu labor. Ele não fez de sua habitação as extremas fronteiras do campo, mas sim os largos e cultiváveis centros, onde a vida é plantada e floresce em amplas colheitas das quais está sempre arrancando as ervas daninhas, e, como um bom jardineiro, preparando o solo para que quando o Semeador passar com seu braço a balançar e lançar sementes, de maneira quase descuidada, nenhuma delas caia fora dos lugares onde seus frutos hão de produzir trinta, sessenta, ou cem.