Entrevista de ocampones.org – SÉRGIO SOUZA
Chesterton é um fenômeno. Não há jovem ligado ao cristianismo (especialmente, mas não só) ou que esteja conectado à internet que nunca tenha ouvido falar seu nome ou entrado em contato com sua obra. Para tanta popularidade tem ajudado, claro, a genialidade do inglês, que escreve maravilhosamente bem e deixa transparecer em seus escritos um cristianismo cheio de alegria, gosto pela vida e avesso a moralismos, mas também o trabalho inestimável da Sociedade Chesterton Brasil, que tem se esmerado em publicar em edições simplesmente fantásticas (tradução, parte gráfica, ilustração, escolha das obras,etc), as obras do “príncipe do paradoxo”. Sobre este belíssimo trabalho, entrevistamos o Diego Guilherme, um dos membros da SCB. Eis:
Quando surgiu a Sociedade Chesterton Brasil?
Bom, a Sociedade Chesterton Brasil nasceu por meio dum projeto anterior chamado Chesterton Brasil. A ideia inicial era reunir tudo o que conseguíssemos de Chesterton, especialmente em português, e disponibilizar em blog.
Antes, porém, eu, Diego, havia descoberto Chesterton em 2009. Isto se dera em um grupo de estudos católicos de que eu participava na UFMG. Um dia, certo amigo apresentou-me a vida e a obra de Gilbert Keith Chesterton. Eu fiquei estarrecido com o fato de nunca ter ouvido falar dele. Não conseguia entender como tantas preciosidades poderiam estar esquecidas e abandonadas. Depois desse dia, eu fiquei tão impressionado que Chesterton tornou-se meu autor preferido.
Comprei o máximo de livros que consegui e os devorava, marcava e anotava.
Certo dia, estava assistindo a uma aula e senti como uma explosão súbita a ideia de fazer um blog para reunir e divulgar o pensamento dele. Descobri que meu amigo Agnon Fabiano já tinha um blog, desde 1999, que reunia excerto de Chesterton e Lewis. Entrei em contato com ele e resolvemos fazer de tudo para divulgá-lo. Tudo no mais generoso espírito de gratuidade — sem dinheiro, nem tempo. Todo nosso trabalho era (e ainda é) feito nas poucas horas vagas e completamente fundado no amor pelo autor e no desejo de torná-lo mais conhecido no país.
Com o ingresso do Raul Martins, vislumbramos a possibilidade de traduzir Chesterton com um português que lhe conservasse o estilo. A partir de 2017, com a parceria com o Instituto Hugo de São Vitor, começamos a publicar os livros por conta própria. Até agora, já publicamos O Poeta e os Lunáticos, A Taberna Ambulante, A Inocência do Padre Brown (este traduzido pelo prof. Carlos Nougué), O Essencial de Chesterton, A Sabedoria do Padre Brown e (quase já no prelo) Eugenia e Outras Desgraças. Temos vários projetos e ideias para executar, mas tudo em seu tempo.
Quem forma a Sociedade Chesterton Brasil?
A Sociedade é formada pelas seguintes pessoas:
Eu sou o Diego Guilherme, atual Presidente da Sociedade. Sou católico, casado, tenho 30 anos, 3 filhos, bibliotecário, cruzeirense, devoto do Beato Pier Giorgio Frassati, admirador do escritor espanhol Juan Manuel de Prada, e chestertoniano inveterado.
Agnon Fabiano é funcionário público e formado em contabilidade. Protestante não denominacional, distributista, co-fundador da Sociedade Chesterton Brasil, fundador da Sociedade C. S. Lewis Brasil. Um apaixonado por livros e apreciador das habilidades humanas mais antigas e rústicas como construir as próprias cadeiras, cobrir o próprio telhado ou consertar o próprio encanamento. Amante irresponsável do conhecimento.
Raul Martins Lima, tradutor e revisor, cristão com um pé lá, outro cá, há de fazer 29 anos agora no dia 8 de fevereiro. É casado e está a postos, aguardando a chegada iminente de seus dois primogênitos, que escolheram vir de uma só vez e um ser (literalmente) a cara do outro.
Vocês notam a influência de Chesterton em ambientes não religiosos?
Sem dúvida. Quando a SCB tomou certas proporções, começamos a receber várias solicitações para tirar dúvidas, direcionar bibliografias e outros materiais para alunos construírem seus TCCs e outros trabalhos acadêmicos sobre Chesterton. Chegamos a criar um grupo de discussão entre essas pessoas para darem suporte uns aos outros.
Por outro lado, a visibilidade de Chesterton na internet e principalmente nas mais diversas páginas e perfis não religiosos das redes sociais é prova incontestável de nosso trabalho. Há todo tipo de página promovendo o pensamento de Chesterton. Basta uma busca geral e acharemos páginas sobre Política, Economia, Filosofia, Marketing, Administração, etc. Em quase todas essas áreas, sabemos ter havido palestras ou encontros para divulgar algo de Chesterton. Nós mesmos já fomos convidados para realizar palestras sobre o autor. Infelizmente, os recursos financeiros nos têm limitado para tal atividade que seria prestada com muita alegria. Quem sabe no futuro conseguimos mais apoio.
Vocês já percebem o impacto do trabalho da SCB na divulgação da obra de Chesterton?
Uma das maiores alegrias que nós temos é perceber o impacto inegável que a SCB gerou na divulgação de Chesterton. Quando começamos nossos trabalhos havia, no Brasil, talvez uns três ou quatro livros de Chesterton disponíveis no mercado. Hoje temos mais de 20 livros em circulação, publicados por diversas editoras. Todavia, Chesterton escreveu quase 100 livros e quase 5 mil artigos. O que temos em circulação de seus escritos ainda é pequeno. Nosso objetivo é publicar tudo o que ele escreveu. Nossa empreitada é finalizar a coleção Padre Brown neste ano. Se Deus quiser, teremos boas novidades ainda em 2019.
De que maneira Chesterton pode ajudar o leitor brasileiro? E o Distributismo? É um tema atual e necessário?
Chesterton dizia que a multiplicidade de opções nos deixa desamparados devido a dificuldade de escolher por onde começar. Portanto, falar dos benefícios que Chesterton pode trazer ao Brasil nos deixa atônitos. Contudo, poderíamos usar as palavras de outro grande escritor, C. S. Lewis, considerado o homem que mais lia na Inglaterra de sua época, quando disse: “Chesterton era o mais sensato de todos [os homens que eu lia]”. “É bom ler Chesterton contra as melancolias de todos os fanáticos”, disse um festejado filósofo espanhol. Em um tempo de extremismos, manipulações, ideologias e guerras culturais, a leitura de Chesterton é uma candeia acesa colocada no velador para iluminar os compartimentos do mundo e da vida, evitando que o homem tropece. Além do mais, Chesterton mostrou e provou de forma extraordinária que a virtude pode rir-se do vício e que a debilidade pode rir-se do poder. Isso gira os valores do mundo de ponta-cabeça — que era a especialidade do nosso gordinho — e dá sentido e força à vida daqueles que acreditam no senso-comum, na tradição, na família, na democracia e na religião em detrimento das pressões externas das ideologias e cosmovisões progressistas que desprezam o mais íntimo da natureza humana. Acredito que os pensamentos e obras de Chesterton nos permitem amar a sanidade, a gratidão, a beleza e a simplicidade. Enfim, como podemos ver pela própria vida de Chesterton, a vontade honesta e ardente de encontrar a Verdade é o maior benefício da vida. Isso tudo, o Brasil inteiro pode aprender com Chesterton. E esse é o grande intento da SCB: tornar acessível um remédio que comprovadamente tem curado, aos milhares, mundo afora.
Quanto ao Distributismo, sim, cremos que é um tema importante a ser discutido. Chesterton dizia que não pretendia que o Distributismo fosse implantado em sua época, mas que desejava apenas que as pessoas tomassem consciência de seu significado, gerando pequenas atitudes diárias regidas por seus princípios. Dizia ele: “A primeira pergunta que se faz a um distributista prático não é ‘o que os outros têm que fazer?’, nem ‘o que o governo tem que fazer?’, nem ‘o que a Liga Distributista tem que fazer’, senão ‘o que eu tenho que fazer?’. E a primeira resposta a essa pergunta é: ‘devo fazer alguns sacrifícios’.” Valorizar a pequena propriedade, ser justo nas nossas relações pessoais, não querer utilizar as pessoas como instrumentos, buscar o fortalecimento do núcleo familiar, não se render às pressões ideológicas da megalomania econômica, valorizar o homem simples, etc. Isso torna a discussão do Distributismo não só possível, mas imprescindível, porque é um “modelo” completamente arraigado numa antropologia que considera a felicidade do homem a partir de uma análise real da humanidade e não através de loucas filosofias do desespero e do caos.