O distributismo de G.K. Chesterton

Por Pablo Gutierrez Carreras
Publicado originalmente em Religión en Libertad, traduzido por Voto Católico Brasil

No início do século XX, dois pesos pesados da literatura britânica (Chesterton,“um peso pesado” literalmente, e Hilaire Belloc) empreenderam uma luta quixotesca defendendo uma doutrina econômica ignorada pela história.

Um deles era, antes de tudo, um jornalista; o outro, mais que tudo, um historiador. Não tinham nenhum diploma de economistas, mas, já sabemos hoje que isso não importa muito.

Luzes do distributismo

Hoje o distributismo é uma nota marginal conhecida por uns poucos estudiosos. Ainda assim, em alguns âmbitos do pensamento universitário americano, o distributismo volta a dar algumas luzes, alguns elementos para a reflexão.

Neste debate intelectual, Chesterton, dotado de um providencial bom humor e de uma caridade que não desaparecia nos fragores das polêmicas que com frequência levantava, escreve estes ensaios acadêmicos com um enfado monumental.

O inimigo declarado é a plutocracia, os grandes capitalistas e seu apêndice, os meios de comunicação em massa.

Seus ensaios sobre o tema estão coletado em La utopia capitalista e otros ensayos (NdT: ainda sem versão em português), publicado originalmente em Nova York, em 1917, sob o título Utopia of usurers and other essays.

Reunia nove artigos que formavam o Utopia of usurers e outros dezessete pequenos ensaios que foram publicados no Daily Herald, diário inglês de ideologia socialista

O que está errado… e como consertá-lo

Nestes artigos, Chesterton fundamentalmente critica muitas facetas da vida degradadas pelo capitalismo.

Destaca:

– sua rejeição à revolução industrial;

– sua denúncia das condições do trabalho assalariado;

– a degradação do jornalismo;

– a denúncia de um louvor servil aos capitalistas;

– a prepotência dos intelectuais partidários da eugenia;

– a mescla de interesses financeiros e políticos.

Soa familiar? Mas não, não tem nada a ver com a, já desgastada, critica esquerdista à economia capitalista.

Porque se, na análise dos excessos e das falhas de um sistema completo e integral (não só econômico), podemos estar de acordo, é na solução para estes problemas identificados que nos distanciamos.

Para Chesterton é possível entrar em acordo para perceber que a prostituição é um mal. Porém, chegaremos a um acordo sobre o valor da castidade?

Compartilhar um diagnóstico não é o mesmo que compartilhar as soluções.

As alternativas chestertonianas

Chesterton não realiza um mero exercício de crítica. Ao contrário, vê-se através de suas denúncias suas proposições:

– a empresa familiar;

-o sistema de proteção social baseado na auto-organização, não na dependência do Estado;

-o amor ao Homem comum.

Nunca caiu na admiração que os liberais ingleses (tradicionalmente partidários de governos limitados, da autonomia municipal e do direito “conhecido” pela comunidade, de modo que a vida, a propriedade e a liberdade fossem garantidas) acabaram demonstrando pelo estado protecionista e interventor que se desenvolveu na Alemanha de Bismarck.

Nunca se fascinou por esse Estado e soube apontar a perda de liberdade que a segurança garantida pelo Estado provocava.

O Estado Servil, uma nova escravidão.

Importantíssima é, também, sua crítica ao Estado Servil. Este termo, que procede de uma obra homônima de Belloc, designa uma terceira forma de sistema que não encaixava nem nos moldes do sistema capitalista nem nos do socialista.

Para Belloc, o Estado Servil seria uma forma sob a qual o trabalho assalariado de uma imensa maioria da sociedade – sem propriedade e sem liberdade- , seria obrigatório, em beneficio de uma minoria com toda as propriedades.

Para ele, o Estado Servil não seria a culminação do socialismo, pois o socialismo somente poderia realizar-se mediante o confisco total da propriedade e dos meios de produção. Porém, o capitalismo, a concentração ou a tendência ao trust e ao monopólio e a crescente atividade regulatória do Estado em detrimento da liberdade e da propriedade individual, conduziam ao estabelecimento do Estado Servil e com ele, uma nova escravidão, cujas condições não seriam tão duras e ignominiosas como as da escravidão que conhecemos.

O pequeno é melhor

Chesterton retornará a estes temas, que formam parte do núcleo da doutrina distributista, no seu livro The Outline of Sanity (Os limites da Sanidade).

Uma das questões que mais ocupou a Chesterton é o combate frente ao tamanho das empresas. O que, certamente, ajuda à reflexão atual. Não interessa a Chesterton a dicotomia público-privado, pois não é essa a que lhe parece decisiva.

Se as coisas continuam como estão, chega a dizer, não fará diferença se uma fábrica é pública ou privada e ninguém se importará com isso. A questão decisiva é a da grande empresa frente à pequena propriedade; a do monopólio frente ao homem e á família, ou, dito claramente, à do servilismo frente à liberdade.

Esta questão é permanente em seus escritos.

Não é por serem privadas que as grandes empresas seriam para Chesterton uma coisa boa.

Aponta em várias ocasiões, um dos problemas que, segundo ele, derivavam do crescimento monstruoso das empresas: a perda de qualidade dos produtos. De novo, surpreende sua intuição e sua antecipação ante nossa realidade econômica que se baseia em produzir grandes quantidades de artigos de baixíssima qualidade (só faltou citar o Made in China) para manter as vendas para que a engrenagem econômica siga girando, ainda que não saibamos bem para onde nem porque.

Daqui a importância de resistir à tentação ao monopólio.

Sua proposta de estender o direito à propriedade têm seu fundamento explícito na doutrina de Leão XIII exposta na Rerum Novarum, que, coletando as doutrinas do direito natural, considera que o Homem tem o direito não só de apropriar-se dos frutos da terra, mas de possuí-la permanentemente.

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